Reflexão


"Já não é a mesma hora, nem a mesma gente, nem nada igual. Ser real é isto" - Alberto Caeiro

"A imaginação é a rainha do real e o possível é uma das províncias do real" - Charles Baudelaire

Sunday, April 25, 2010

O Fim da Imaginação?


Na introdução de qualquer obra da coleção: “A obra-prima de cada autor” da editora Martin Claret, temos a afirmação de que o mundo lê mais. Creio que essa afirmação seja válida tendo como referência algumas cidades no Brasil, Uberlândia(MG) ou Curitiba(PR) são exemplos. É só andar um pouco pelo centro destas cidades ou circular de ônibus que poderemos ver: jovens, velhos, homens e mulheres com alguma obra literária na mão. Poder ser estrangeira ou brasileira, um livro técnico ou um manual de cursinho, mas o fato é que as pessoas realmente estão lendo mais. Essa leitura é uma forma de conquistar uma autonomia intelectual, isto é, a liberdade de quem lê? A Literatura por si poderia proporcionar tal fato?

Claro, essa pergunta depende muito do que entendemos por literatura, mas deixo essa questão para quem escreve sobre isso, como é o caso do filósofo Jean Paul Sartre que tem uma belíssima obra intitulada “O que é literatura”, que define melhor esse conceito. Prefiro compreender e analisar o homem, como um ser em construção histórica que busca sua felicidade, sua liberdade.

A leitura, assim, no meu entendimento é uma atividade onde o leitor cria e projeta sua principal objetivação, sua liberdade absoluta, só encontrada na fantasia. Todavia, a leitura libertadora tem quer ser dedicada ao conhecimento em si, ou seja, tem que estar ligada ao desinteresse das coisas práticas. Uma leitura que visa um conhecimento prático torna o sujeito que lê um prisioneiro. Um exemplo dessa afirmação seria quando um engenheiro lê uma obra específica sobre sua profissão, temos aí uma tautologia, uma prisão, pois o propósito da leitura é a construção de uma casa ou edifício. Como esse leitor, através de seus livros técnicos pode ter acesso a uma liberdade absoluta se seu objetivo na leitura foi à criação de algo? Sua ação foi determinada a priori, ou seja, o livro foi utilizado com uma ferramenta a mais de trabalho e não como uma fonte de fantasia. Ao ler uma literatura brasileira ou universal, temos em fase de crisálida, uma leitura onde o leitor tem sua liberdade absoluta consolidada, claro que isso só é válido se o leitor não leu a obra para prestar um vestibular, mas sim por querer projetar sua imaginação, alienar-se na leitura. A não busca de um objeto ou ação prática e o engajamento em uma leitura desinteressada de qualquer valor posteriori, tem em essência a liberdade. Isso se dá na literatura e não em outros gêneros, pois a literatura em si é o refúgio dos sonhos, da esperanças de uma vida melhor.

O pensador Michel Foucault afirma que a liberdade existe quando cuidamos de nós mesmos. Nesse sentido, ler é cuidar de si, das nossas “ilusões contemporâneas”. Não estou negando que ao ler um romance o leitor não terá adquirido conhecimentos práticos, pois queira ou não, ler é refletir; assim é óbvio que o leitor terá mudanças em seu vocabulário, talvez até em sua prática social.

Não devemos tomar essas idéias como verdades absolutas. São no máximo representações de uma constatação, de que o uso da literatura nos vestibulares tornou-se apenas um instrumento para se manter um status ou um obstáculo a mais para aqueles que vão tentar o vestibular. Não há mais fantasia pela leitura, somente uma racionalidade. Ler os livros para conquistar uma vaga na instituição, seria o fim da imaginação?

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